terça-feira, 29 de janeiro de 2013

RASTROS INSULARES - N 01°38’ - E 07°29’ - S 0°51’ - WO 46°38’




Título: RASTROS INSULARES - N 01°38’ - E 07°29’ - S 0°51’ - WO 46°38’
Artistas: Martine Bordenave e Philo Fournier
Local: Gratuliano Bibas (Espaço Cultural Casa das Onze Janelas)
Data de abertura: 05 de fevereiro, às 19h
Período da exposição: 05 de fevereiro a 03 de março de 2013.
O funcionamento do Espaço Cultural Casa das Onze Janelas é de terça a sexta das 10h às 18h e nos sábados, domingos e feriados, das 10h às 14h.


“Se é de terra que fique na areia/O mar bravo só respeita rei!”
Folia de Reis. Chico Anysio e Arnaud Rodrigues


Coordenadas geográficas aproximativas de dois continentes, experiências distintas. Mesmo assim, complementares. África, Brasil. Duas vilas de pescadores, vidas de complexidade aparentemente simples e rude. Lugares pouco afeitos às sentimentalidades. Contudo, repletos do humano. O que é, é. Dois artistas, três continentes. Europa. Existências em transito, em choque e contaminações.

Nas mãos do pescador, o pescado. Suas redes, suas vitórias e derrotas deixadas no fundo do mar. Lugar de intensa luta pela sobrevivência e embate entre homem e natureza. A multiplicidade de interesses e capacidade expressiva de Philo Fournier irradia destas profundezas sua vitalidade. Isolado na escuridão da madrugada confabula com fenícios, romanos, portugueses, polinésios, africanos e brasileiros. Tantos outros que lançaram suas redes antes dele e, que por seu desalento, poderão brevemente não coletar mais as dádivas de Netuno. O mundo em escala global modifica-se radicalmente. O orgulho solitário do homem de mãos calejadas dá lugar à pesca de arrastão, indústria da tonelada e do morticínio irracional das espécies marítimas. Deste conflito surgem paisagens sonoras, e em vídeo, como tristes testemunhos de um tempo que se esvai como na sutileza de um farfalhar de velas. É África. Imagens que replicam a sujeira que abarrota as praias do litoral norte e se perguntam o porquê? É Brasil. São como roupas abandonadas nas areias do esquecimento.
Martine Bordenave traz em si o silêncio montanhês. Sua pintura de gestos largos e soltos são como a dança das mãos da bailarina que é. Rostos não revelados, almas a revelar-se. Carga anímica da negra África. De poucas palavras, possui olhos atentos às minúcias do mundo. Uma raiz, um galho retorcido, conchas e detritos na praia. Plásticos, bóias de isopor. Estes restos reveladores da ação negativa humana. Ação predatória e de desequilíbrio que contrastam com a delicadeza de seus apanhados. Ao reordená-los com objetos e instalações potencializa suas falas demonstrando-nos o quanto necessitamos, todos nós, de zelo e atenção para com o nosso derredor. Somos fruto e semente daquilo que plantamos.
Segundo a tradição japonesa de cerâmica Raku, uma peça delicada, ao partir-se, não deve ocultar seu acidente. Ao ser restaurada deve evidenciar a queda, o ocorrido, suas cicatrizes. Assim, fios de ouro aplicados em suas reentrâncias reafirmam que viver é risco, é aprendizado, é atentar para os seus próprios erros. E, que afinal, se não podemos retroceder ao passado, somos capazes de reconfigurar nossos destinos. Às vezes, basta um simples gesto de cumprimento como tentativa verdadeira de perceber o Outro.
Armando Queiroz
Vila dos pescadores, 2012

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